Na Grécia Antiga, os Ministros do Culto de Asclépios, que os latinos chamavam de Esculápio, - o deus da medicina, eram sacerdotes médicos, que tratavam os doentes nos templos. Hipócrates, na Ilha de Cós, ainda que iniciando uma era, dita científica, desse ramo do conhecimento, tinha, como o pensamento grego da sua época, a idéia da medicina como arte digna dos deuses. E vejam bem o paralelismo daquele templo de Esculápio com o nosso hospital de hoje. Templo era o local sagrado dentro do qual os sacerdotes tratavam os doentes e interpretavam os presságios. Por isso, etimologicamente, "contemplar" quer dizer, examinar cuidadosamente para sondar o mais profundo. E não é essa, ainda hoje, uma das atribuições do médico? Descobrir o encoberto? Ver o invisível? O imaginário grego colocou Asclépios como filho do próprio Apolo. E a mitologia nos conta que como fizesse tais progressos em sua arte, chegando até a ressuscitar vários mortos, Zeus, temendo que a ordem do mundo fosse abalada, fulminou-o com o seu raio. Apolo, não tendo condições de vingar-se de Zeus, seu pai, matou os Ciclopes, que fabricaram o raio que eliminou o deus da Medicina. E Asclépios ressuscita no Olimpo e continua a promover a arte de curar. Eis assim o médico presente até no confronto entre os deuses. Essa simbologia grega traz em minha mente a imagem de um homem, um médico, um exemplo que como Asclépio superou a sua própria competência objetiva para ter o servir como sua missão de vida e com quem todos nós aprendemos muito, não só como médico, cirurgião e gestor,mas acima de tudo como figura humana. Certamente eu estou me referindo ao nosso saudoso amigo Ronaldo Luiz Gazolla , que através de sua sensibilidade, espiritualidade e cidadania transformou nossa Saúde Pública Municipal, em Benchmark para todo o país. E, só temos a agradecer que a medicina tenha emprestado sua competência, e, sabemos o que isto representou de sacrifício pessoal, para que ao longo de 10 anos frente à Saúde do Rio de Janeiro, a Rede Municipal pudesse ser estruturada, revigorada e acreditada, na acepção da palavra, dentro dos preceitos do SUS. Gazolla, para nós era um exemplo e uma liderança natural que inspirava a geração de um pensamento energético, de um pensamento médico não compartimentado, holístico. Seria talvez, dentro dos parâmetros hoje conhecidos, um exemplo modelar do que deveria ser o padrão comportamental do médico deste novo milênio, onde a intuição e o coração passam a ter peso e relevância semelhante ou maior que a razão . Neste contexto o templo-hospital de nossos dias não deve e não pode abrigar vaidades e confrontos, mas sim um núcleo de pensamentos unidos, onde o material e o espiritual se entrelaçam holisticamente. A eficácia de um tratamento depende da conjunção de todos elementos, pois, nos templos-hospitais de qualquer época, se concentram várias formas de energias vitais para recuperação do corpo e da mente, sendo isso parte do processo de evolução do ser humano. Cada um de nós, em nossa função gerencial deve ter sua mente voltada não somente para a execução de nossas tarefas. Temos que que ir mais adiante e agregar valores não convencionais. Olhar o mundo que nos cerca através de todos os ângulos. Olhar não somente como um sentido integrante de nosso cérebro, mas olhar também com o coração. Temos que acreditar no que estamos fazendo, de "sonhar"e correr atrás, de"crear"(de creação como ele dizia) e "servir", que somados permitirão melhores resultados no cumprimento de nossa missão.
Por mais que aceitemos a doutrina espiritualista, que acreditemos que o nosso corpo seja apenas um molde qualquer , ainda assim, a passagem de Gazolla nos deixa ainda com uma grande sensação de vazio, de perda e de tristeza. Mas, por outro lado estamos convictos da imortalidade de seus ensinamentos, de sua alma e de seu exemplo que sempre servirão de inspiração, assim como a mim, a todos os seus amigos e colegas que partilharam de seu convívio nesta Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro.
Sidney Beltrão
Sidney Beltrão
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